Sérgio Barra , cardiologista do Hospital da Luz Arrábida, é um dos 27 especialistas de todo o mundo que integraram a Comissão da revista The Lancet, que nos últimos três anos elaborou um documento com uma estratégia para reduzir a elevada incidência de morte súbita cardíaca em todo o mundo. O plano de ação foi agora apresentado no congresso anual da Sociedade Europeia de Cardiologia, que reuniu mais de 30 mil profissionais de todo o mundo em Amesterdão, entre 25 e 28 de agosto. A Comissão foi constituída em 2020 a convite da revista The Lancet , uma das mais importantes revistas médicas no mundo. “Apesar dos grandes avanços na medicina cardiovascular, a morte súbita cardíaca continua a ser um enorme desafio médico e social, ceifando quatro a cinco milhões de vidas todos os anos e sendo responsável por mais anos de vida perdidos que qualquer cancro individualmente. Apenas todos os cancros em conjunto têm maior impacto que a morte súbita cardíaca em anos de vida perdidos ” , afirma-se no documento. E “embora o número de pessoas falecendo de causa súbita cardíaca se tenha mantido relativamente estável durante anos, é pouco aceitável que a sobrevivência à paragem cardíaca súbita continue a ser inferior a 10% na maior parte do mundo”, acrescenta-se. “Participar neste trabalho em conjunto com uma equipa de tão grande valor a nível internacional foi um enorme privilégio e uma ótima experiência”, diz Sérgio Barra. “O nosso objetivo é que o documento seja útil não apenas para cardiologistas, mas para uma ampla gama de especialidades e subespecialidades, incluindo medicina interna, medicina geral e familiar, emergência médica, neurologia, genética médica e outras, bem como para investigadores e decisores de políticas de saúde”, explica. “ The Lancet Commission to reduce the global burden of sudden cardiac death: a call for multidisciplinary action ” pode ser lido e descarregado (acesso livre até 16 de outubro de 2023). Os trabalhos da comissão centraram-se na “morte súbita natural devido a causas cardíacas”, que é vulgarmente designada como “morte súbita cardíaca”. O documento coloca grande ênfase na necessidade de desenvolver uma estratégia multidisciplinar que englobe todos os aspetos da prevenção e tratamento. Fornece ainda uma avaliação crítica dos atuais esforços científicos neste campo e apresenta “recomendações importantes para desafiar, ativar e intensificar os esforços da comunidade científica global com novas direções, investigação e inovação para reduzir o fardo da morte súbita cardíaca em todo o mundo”. Estas são, em síntese, as 10 propostas ou “mensagens-chave”: Abordagem multidisciplinar, aumento da colaboração internacional em investigação e constituição de equipas especializadas de socorro a casos de paragem cardíaca súbita. Registos populacionais fiáveis de morte súbita cardíaca, para impulsionar a investigação e influenciar as decisões políticas de saúde pública. Estratégias preventivas de curto prazo com o objetivo de prevenir a morte súbita cardíaca nos minutos, horas e dias anteriores ao evento. Recurso à Inteligência Artificial, ciência de dados e tecnologias emergentes para desenvolver modelos de previsão. Alargamento dos testes genéticos para melhor identificação das pessoas em risco e descoberta de novos mecanismos de doenças. Abordagem mais individualizada no âmbito da investigação avançada sobre cuidados de reanimação. Sistemas regionais de cuidados, para garantir a triagem adequada dos doentes. Melhor acessibilidade a desfibrilhadores externos automáticos e alargamento da formação da população em reanimação cardiopulmonar. Aperfeiçoamento dos métodos de autópsia em casos suspeitos. Desenvolvimento de programas de reabilitação eficazes dirigidos aos sobreviventes e suas famílias.